sábado, 21 de novembro de 2015


Na Sala de Entrevista

    Poderia ter sido apenas mais uma entrevista de trabalho, como tantas outras.
Porém, eu jamais havia sido confrontada com uma psicóloga antes. E não fazia a menor ideia do quão profunda e avassaladora seria aquela experiência e do que ela significaria na minha vida a partir de então.

    E a entrevista começa: "Hoje quero saber de ti. Da tua vida. Desde o teu nascimento até este momento aqui. Fica à vontade, segue teu ritmo." E as perguntas foram surgindo, cada vez mais profundas...

    Conforme ia avançando na minha narrativa de vida, um nó se formava em minha garganta. Às vezes, engasgava. Às vezes, a voz sumia. Avisei que pularia algumas partes, pois sabia que não aguentaria. Mas a tentativa de manter o controle da situação foi completamente em vão...

    Essa tentativa frustrada de evitar as partes emotivas por insegurança,  me fez lembrar minha primeira  aula de direção da auto-escola. Quando avistei adiante de mim, justamente no trajeto que meu instrutor me indicava pra seguir, uma subida imensa, me neguei a seguir suas ordens e decidi por outro trajeto, por conta. Questionada a respeito, expliquei a ele que tinha um medo extremo de aclives muito acentuados. Que já tivera muitos pesadelos nos quais eu perdia o controle do carro, que descia desgovernado rua abaixo...

    Bastante compreensivo, ele disse que "tudo bem". Me senti mais segura e continuamos andando. Porém, poucos minutos mais tarde, me vi diante de um  aclive muitíssimo pior que o anterior e de maneira que não havia absolutamente nenhuma outra saída, a não ser subir. Entrei em pânico. O instrutor, do alto de sua calma inabalável, apenas insistiu que eu seguisse em frente e que confiasse no trabalho dele. E muito pior que me obrigar a  subir... foi solicitar que eu parasse no ponto mais íngreme. Desta vez, já me sentindo um tanto intimidada, obedeci. Na sequência, como que por encanto, seguindo rigorosamente suas instruções, consegui arrancar com o carro, sem que esse corresse um centímetro sequer para trás. Fui pra casa feliz naquele dia, pois eu havia sido confrontada com um grande medo meu e, mesmo com alguma dificuldade, conseguira vencer. Graças à habilidade dele ao insistir em promover o confronto que eu havia tentado burlar com tanto esforço.

    Durante a entrevista, conforme iam surgindo as perguntas, eu ia abrindo as gavetinhas, há muito tempo guardadas em minha memória. Eu ia lembrando...e narrando... Lembrava de palavras, lembrava de pessoas, lembrava de acontecimentos... e uma dor imensa que já me parecia esquecida, morta e enterrada...tornou a mim como se eu estivesse vivendo tudo outra vez.. Não tardou para que as lágrimas rolassem e para que os soluços interrompessem minha fala, cada vez com mais frequência. Minha interlocutora gentilmente me ofereceu uma boa quantidade de lencinhos e me incentivou a continuar. Todo e qualquer controle que eu achava que tinha sobre meu imenso armário de gavetas abandonadas...simplesmente ruiu.

    Agora, minha narrativa já era um barco à deriva. Acabei me deixando levar por toda aquela emoção que há muito eu julgara morta. Entretanto, naquele momento, renascia ela. E com uma força estrondosa...absolutamente indomável.

    Me vi despida de toda e qualquer defesa. Todos os meus medos expostos, todas as minhas dores, todas as minhas mágoas, todas as minhas fraquezas. O meu "eu" mais profundo...estava nu. Bem ali, diante de nós duas. E a essas alturas, ele já havia parado de tentar se encolher, em busca de alguma proteção. Estava entregue.

    Quando as perguntas cessaram, depois de derramar meus litros de lágrimas e de já ter meu rosto desfigurado de tanto chorar, fui gentilmente informada de que a intenção de tudo aquilo era justamente aquela: conhecer a minha essência. Fui aconselhada a fazer terapia para trabalhar melhor a organização das minhas "gavetas". Nos despedimos com um abraço terno, onde me senti completamente acolhida e segura.

    Voltando pra casa, enquanto ia andando pela rua, ainda chorando, eu me perguntava se minha essência era boa ou ruim. De qualquer forma, segui as instruções e me inscrevi pra fazer terapia. Começo no ano que vem e estou bastante feliz com a possibilidade dessa nova experiência. 

    Pouco tempo depois da chegada em casa, recebi uma ligação. Fui contratada. Alguém esteve diante da minha essência e não achou tão ruim assim... Desde então, minha alma segue iluminada e sorridente, como essa linda tarde de sábado... Estou Mega Feliz!!! :D




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